ECONOMÍA | 04.12.2025
Economia e investimento na Europa: cinco pontos cruciais e o papel estratégico do seguro

Eduardo García Castro
Economista especializado da MAPFRE Economics
A União de Poupança e Investimento (SIU, nas siglas em inglês) deixou de ser mais uma iniciativa técnica na pauta europeia para ser uma resposta estrutural aos grandes desafios de nossa época. A Europa está diante do fim do dinheiro barato, da transição climática, da concorrência mundial pelo capital e da necessidade urgente de reconstruir a confiança do consumidor nos mercados financeiros.
Nesse cenário, a SIU se apresenta como um projeto destinado a converter a economia europeia em um motor de crescimento sustentável e resiliente. E, nesta mudança, as seguradoras não são participantes secundários: elas constituem pilares fundamentais.
O primeiro pilar: impulsionar a economia em direção à economia real
As propostas atuais visam canalizar o capital institucional para ativos produtivos. A SIU tenciona guiar a economia para investimentos que considerem o próximo trimestre e financiem a inovação, as infraestruturas e a transição energética. As seguradoras, por sua natureza de longo prazo, estão em melhor posição para liderar esta mudança. As reformas da Solvência II avançam neste sentido, reduzindo as cargas de capital para a compra de ações a longo prazo e projetos sustentáveis, removendo entraves históricos e abrindo a porta para uma nova era de investimento institucional. Em síntese, SIU e Solvência II são pautas complementares: ambas buscam que seguradoras e fundos de aposentadoria desempenhem um papel mais ativo no financiamento da economia real sem comprometer a solvência.
Uma questão de soberania, não apenas de finanças
Este movimento extrapola a questão financeira: é geopolítico. Enquanto a Europa lança a SIU, os Estados Unidos e a Ásia já dispõem de mercados de capital profundos e dinâmicos. Se a UE não mobilizar sua própria economia interna, ficará dependente de capital externo para financiar sua transição ecológica e digital, com riscos estratégicos evidentes. A SIU é, portanto, uma política de soberania financeira, criada para reduzir a dependência e reforçar a autonomia econômica da Europa. As seguradoras podem servir como ponte entre a economia doméstica e o investimento produtivo, evitando que a Europa fique estagnada na corrida global pelo capital.
O desafio cultural e tecnológico
A Europa continua sendo uma economia centrada nos bancos, onde a economia das famílias se concentra em depósitos e produtos de baixo risco, e na qual os mercados de capital são fragmentados por diferenças regulatórias, fiscais e culturais. A SIU pretende reverter isto criando um mercado único capaz de canalizar os mais de 33 trilhões de euros em ativos financeiros pertencentes aos lares europeus para projetos que reforcem a competitividade do continente. Sem esta mudança, a Europa ficará em desvantagem em relação aos EUA e à Ásia, onde a economia flui para capital de risco, infraestruturas e tecnologia.
Aqui as seguradoras possuem uma vantagem competitiva: confiança histórica e capacidade para oferecer produtos híbridos que combinam segurança com exposição progressiva ao mercado. Rendas vitalícias e unit-linked são exemplos de soluções que podem agir como impulsionadores da mudança cultural que a SIU demanda. Mas persistem entraves: baixo conhecimento financeiro, fragmentação fiscal e preferência pela liquidez. Superá-los requer transparência radical, incentivos fiscais uniformizados e educação financeira em massa.
A disrupção tecnológica aumenta a pressão
As plataformas digitais, os robo-advisors e as fintech estão redefinindo a distribuição dos produtos financeiros. Se as seguradoras não incorporarem experiências digitais transparentes e personalizadas, perderão importância em relação a concorrentes mais ágeis. A oportunidade reside em aliar a força regulatória e de reputação do seguro com a inovação tecnológica, visando oferecer soluções simples, sustentáveis e acessíveis.
Conclusão: assumir a liderança ou ficar para trás
A SIU não é apenas uma política pública: é um terreno competitivo. Quem for capaz de oferecer produtos simples, confiáveis e fiscalmente atraentes conquistará a economia europeia. As seguradoras têm a vantagem da confiança, mas precisam modernizar sua proposta de valor. Inovação em produtos, transparência radical, educação financeira e pressão para incentivos fiscais padronizados são partes fundamentais desta estratégia. Não agir deixará margem para que bancos, gestores de ativos e fintech tomem a dianteira.
Em suma, a SIU é muito mais do que uma reforma financeira: é um projeto de transformação econômica e cultural que busca redefinir a relação entre economia e investimento na Europa. Para as seguradoras, o desafio não é cumprir a regulamentação, mas se antecipar e conduzir a mudança. Aqueles que compreendem isso não apenas sobreviverão, mas se tornarão arquitetos da nova economia europeia.
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